domingo, 21 de fevereiro de 2010

Nunca nesse mundo.

Nunca nesse mundo se está só.
Posso sentir e até ouvir o silêncio quase perfeito, não fosse o tritinar dos grilos, e o vento forte do ventilador no maior nível, meus mais fiéis companheiros essa madrugada.

Consigo imaginar a quantidade de pessoas que dormem, brigam, choram, sorriem, fazem amor e morrem a essa hora da madrugada.

Mas que durmam bem e que tenham bons sonhos. Que descansem o tempo suficiente pra encararem logo menos a realidade do dia. O trânsito caótico - não importa de onde, trânsito é sempre assustador - da cidade, as pessoas infelizes na fila do banco, o filho ligando pedindo autorização pra ir ao show do Ozzy Ousborne ou do Parangolé - ou qualquer coisa extrema assim que brinque com os nervos.
Descansem com os anjos.

E que cada grito dado durante a briga seja válido. Consigam provar porque estão certos, e perdoem quem está errado.
Desculpem-se os errados e peçam misericórdia a Deus.
Lamentem-se pela briga.
Durmam com os anjos.

Cada lágrima derramada se transforme em alegria absoluta, no dia de amanhã.
E que sejam bem-aventurados, de fato, os que choram, para que sejam consolados.
O choro de um pecador, como o de uma criança que vem ao mundo, desesperadamente em busca da vida.
Que o pecador chore e nasça outra vez.
Mas que fique com os anjos.

Os sorrisos sejam como flores desabrochando, levando paz e alívio aos corações.
Sorrisos sinceros e humildes.
Extravagantes. Sorrisos que tragam à nossa vida mais um motivo pra continuar a jornada por aqui.
Um sorriso que esconda a luta por segundos.
Mas que permaneçam com os anjos.

Um sexo com amor, entre marido e mulher que mesmo após 20 anos de casamento permaneçam com a sede de se amarem, a vontade de se tocarem e a ansiedade pelas próximas juras renovadas de amor ao pé do ouvido.
E que continuem com os anjos.

E a morte, por fim, sombria, que seja silenciosa, que não seja dolorosa.
Virá como flecha. Talvez dê tempo de doer, talvez não.
Mas que não doa.
Que permaneçam vivos, dentro dos que reservaram um espaço no coração pra esses tais mortais.
Mas que vão, e que vão com a certeza de que tudo isso fizeram.

Que os anjos os abracem e que finalmente possam dizer : Eu nunca estive só.

O mundo permanece no caos, mesmo com o silêncio que nos engana, dentro das paredes em que nos trancamos.
Continuam dormindo, brigando, chorando, sorrindo, amando e morrendo.
O tempo inteiro.
Ninguém dorme só.
Ninguém briga só.
Nem chora ou sorri só.
Ninguém ama só,
e todo mundo acaba morrendo um dia.

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